“Meu nome é Cristiano e tenho uma certa caminhada na Pastoral da Juventude. Participei por um longo período das instâncias e hoje milito numa ONG que atua na luta pelos direitos da juventude.
Digo que minha vida pessoal é profundamente marcada pelas opções que fiz durante minha passagem pela PJ. E por tudo isso eu sou muito grato. Posso afirmar que até hoje, no trabalho que desenvolvo, estas opções ainda são muito fortes. Contudo, nem tudo foram e nem são flores.
Há gente que você sabe previamente que serão opositores e tentarão de todas as formas, éticas ou não, atrapalhar seus projetos e propostas. Isto é previsível, esteja você no campo que estiver. Contudo, há de se estranhar quando o opositor está nas suas fileiras, quando é um companheiro ou companheira que atua pelas mesmas causas e que já comeu o mesmo pão murcho e tomou o mesmo suco que até hoje você não sabem qual deveria ser o sabor.
É a turma do fogo amigo. Quando você se dispõe a atuar pela vida da juventude, pela sua formação integral e pelo crescimento de sua consciência crítica, sabe que será metralhado por algumas pessoas ou grupos. Há grupos aliados que metralham de volta e alguns destes tiros acabam acertando você. E há nestes mesmos grupos, alguns que enxergam em você o inimigo.
Eu passei por alguns casos assim ao longo da minha vida pastoral. Gostaria de partilhar estas experiências com você que lê este texto agora. Tiro quatro exemplos: de quando eu estava no grupo, de quando eu estava na coordenação e na assessoria da equipe diocesana e outro mais recente, aqui na ONG.
a) No grupo: Minha comunidade sempre foi muito ativa e muito juvenil. Tínhamos um bom espaço e um bom relacionamento com escolas e entidades, o que facilitava a interação. Em razão de tudo isso, fomos escolhidos para acolher o Dia Nacional da Juventude (DNJ) diocesano. A princípio ficamos muito felizes e queríamos organizar as coisas de uma maneira bem feita, afinal jovens de vários cantos e de várias cidades viriam até nossa comunidade. Mas não organizamos nada. A equipe diocesana queria duas coisas de nós: o espaço e nossos braços. Éramos simples tarefeiros e não tivemos nenhum protagonismo naquele DNJ, pelo contrário. Uma das lideranças mais antigas do grupo foi simplesmente desligado da atividade pela equipe diocesana por questionar o modo como as coisas estavam sendo conduzidas. Não houve diálogo. Mas sobrou ressentimento.
b) Na diocese: Passaram-se alguns anos e eu acabei chegando à coordenação diocesana. Eram outros tempos e outras lideranças. Chegou a vez de realizarmos outro DNJ. A experiência que passei quando eu era do grupo da comunidade nunca saiu da minha cabeça. Eu queria fazer algo diferente, com boa participação local e que eles ajudassem no processo. Escolhemos uma comunidade bacana com boa estrutura e participação juvenil. Mas a coisa não correu bem. Eles não aceitavam orientações e queriam fazer e organizar o evento do jeito deles. Soubemos depois de que havia comentários entre eles de que a equipe diocesana, historicamente, gostava de impor sua vontade aos grupos e que a organização do DNJ era fechada, não poderia ser modificada. Eles se rebelaram. Eram extremamente críticos a qualquer mudança que gostaríamos de fazer no plano deles. E, quase em cima da hora para o evento, sob qualquer contrariedade que sentiam da nossa parte, ameaçavam abandonar a organização. Sim, fizeram do jeito deles. E, no final, a avaliação que os jovens participantes fizeram do evento apontou que não foi um DNJ bacana.
c) Na assessoria: Passaram-se mais alguns anos. Acabou meu tempo na coordenação diocesana e eu voltei para o grupo. Fui convidado a exercer o papel de assessor leigo. Aceitei. Com o tempo percebemos que a equipe não dava conta das atividades. Resolvemos criar uma ‘Rede de Equipes Diocesanas’ ou RED’s, que seriam formados por lideranças locais das comunidades e por gente que já passou pela PJ e por isso teria experiência para passar para a turma. Estas RED’s ficariam responsáveis por algumas tarefas que a equipe diocesana não dava conta: músicas e animações, preparar celebrações, fazer a comunicação, fomentar formações, por exemplo. Mas não nos demos conta de que eles acabaram montando uma organização paralela a nossa. E, pior, abocanharam ações que deveriam ser dos jovens. Quando tentamos dialogar, começaram uma campanha de difamação contra a equipe diocesana. Não queriam largar o osso mesmo. Queriam era status. Isto desestabilizou a equipe. Algumas posturas deles acabaram prejudicando nossa imagem perante o clero. Não conseguimos reverter a situação e o bispo dissolveu nossa equipe.
d) Na ONG: sem equipe diocesana, acabei ficando um tempo sem atuar pastoralmente. Decepcionado mesmo. Então surgiu um convite para trabalhar junto com a ONG, onde estou até hoje. Pensamos num projeto de formação para as lideranças da Pastoral da Juventude. E fizemos o projeto. Foi uma ação tão bacana, vinham jovens de vários cantos e de várias dioceses. Conseguimos dar a eles uma visão macro da ação juvenil e da PJ. Alguns passaram pelo nosso processo de formação e já queriam atuar em movimentos sociais, partidos, ONG’s. Algumas lideranças locais, que indicaram jovens para o processo de formação que conduzimos, ficaram frustradas. Elas imaginavam que a rapaziada voltaria toda para fortalecer a PJ local. E isso não aconteceu com todos. Quando tentamos montar uma segunda edição da formação, estas lideranças locais começaram uma campanha contra nós, alegando que formávamos ‘ongueiros’ e não pejoteiros. Tivemos dificuldades, mas conseguimos montar a segunda e a terceira turma deste projeto.”
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Não. Cristiano não sou eu. Cristiano é um personagem que reúne em sua trajetória e seu relato histórias que eu já ouvi e presenciei. Mas ele, do mesmo jeito que eu, também se incomoda muito quando o diálogo não se faz presente nas relações e quando a busca de interesses outros se faz maior do que os objetivos da Pastoral da Juventude. Mas é preciso tocar em frente. Há muita coisa bonita a ser feita.