quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Parábola dos dois irmãos

Havia um pai que criava dois filhos. No passado, eles eram de uma família muito importante, talvez a mais conhecida e respeitada daquela região. Pessoas vinham de longe para ouvir os conselhos do pai. Seus costumes serviam de inspiração e modelo para toda uma população. Mas isto foi em outros tempos. Outras famílias foram ganhando importância. A TV passou a ser a conselheira de muitos. E não restou outra alternativa ao pai e aos dois filhos a não ser se mudarem para um lugar mais distante, onde a riqueza dos outros não os ofuscasse e onde os conselhos do velho pai pudessem ter alguma serventia.

Embora eles tivessem bens e imóveis na região central daquela região, o pai resolveu levar os filhos para um lugar mais afastado. Eles tinham uma casa num lugarejo distante, de poucos recursos e pouco acesso. O pai imaginou que ali seria um bom lugar para criar os filhos e tentar restabelecer a importância da sua família.

Os dois rapazes eram jovens e empreendedores. Ambos amavam o pai e admiravam a história da própria família. Mas talvez as semelhanças entre eles acabassem por aí. O irmão mais velho percebeu que aquela mudança poderia significar um retorno da sua família às raízes de sua história. Pelo que seus tios e avós contavam, os antigos, ao chegarem àquela região, eram um povo admirado não pela sua riqueza, mas pela maneira como partilhavam os bens. Não havia quem chegasse a sua casa e saísse de lá com fome. O que tinham era compartilhado com quem precisasse. E não havia necessitados entre eles. E olhando para a realidade em que se encontrava, o irmão mais velho achava que era a oportunidade perfeita para retomar a história.

O irmão mais novo também havia gostado da mudança. Talvez não tanto como o seu irmão, pois gostava da casa luxuosa que moravam no centro da cidade. Mas a oportunidade de começar de novo poderia reavivar os tempos de glória e importância da própria família. O tempo, que ele lembra, em que o pai era reverenciado por onde passava. O tempo em que cada palavra que o pai dizia era aplaudida. As pessoas se acotovelavam e se deliciavam com os seus conselhos, exemplos e histórias. Tal era o volume de pessoas que naquele tempo vinham ouvir o seu pai falar, que o pobre senhor teve que contratar gente para organizar a multidão. E em torno da figura daquele homem, a cidade foi crescendo. Ah sim. Era esta oportunidade que o filho mais novo vislumbrava.

Em torno deste resgate do passado, os dois filhos começaram a trabalhar. O filho mais velho sabia que não poderia vir com receitas prontas. O passado de serviço que a sua família havia prestado precisaria ser adaptado, pois as necessidades que aquele povo vivia eram diferentes do que vivera no passado. Começou então a articular pequenos grupos, para que as pessoas se conhecessem melhor, pudessem criar confiança em partilhar suas vidas e necessidades e o irmão mais velho pudesse compreender a realidade em que estava se metendo.

O irmão mais novo sabia que para restaurar o passado de glória da sua família precisaria chamar a atenção daquela comunidade para a importância histórica e liderança natural que era o seu pai. Partiu de volta para o centro da cidade onde ainda tinha alguns contatos antigos. Conseguiu uma banda, luzes, enfeites, fogos de artifício, um palco e montou uma grande apresentação onde a aparição do seu pai seria o ponto alto. O show teria propagandas também destes amigos do irmão mais novo que ajudaram a financia-lo. No fim, segundo ele, tudo se autofinanciaria.

O irmão mais velho não tinha amigos tão influentes e com tantos recursos. E mesmo que tivesse, não faria algo como o que fez seu irmão, exaltar um passado de glórias para revive-lo. Ele tinha para si que as pessoas daquela localidade humilde precisavam de melhores condições de vida e não de show pirotécnico e de músicas que envolviam pelo ritmo e por letras que não saiam da cabeça. Mas por outro lado, aquele evento do irmão envolvia as pessoas que por um momento esqueciam-se de seus problemas, embaladas pelas palavras confortantes que o seu velho pai dizia.

O irmão mais velho não queria confrontar o mais novo porque sabia que a briga deles desagradaria o seu pai. Sabia também que não poderia contar com uma ajuda financeira de nenhum deles para tentar organizar o povo, conforme as histórias que ouviu sobre o passado de partilha de sua própria família. E o seu próprio passado de empreendedor não era um mar de rosas. Por muitas vezes fez eventos e atividades com seus pequenos grupos mas que eram todas bancadas pelo pai. Por outras vezes elas não se autossustentavam financeiramente e o filho tinha que tirar de suas reservas para não ficar no vermelho.

Qual a saída para este irmão se manter fiel ao seu propósito? Como bancar suas atividades sem depender do dinheiro do pai ou do irmão?

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