segunda-feira, 12 de outubro de 2020

Ele vem pra me dar a mão

O ano era 2017, finzinho do mês de maio. Entre uma e outra mensagem que acabo recebendo ou sendo marcado no Facebook, uma chamou minha atenção. Dias antes, eu havia brincado com a Bianca e disse para ela que queria um desenho exclusivo, feito por ela, para mim. E ela fez. É a imagem que ilustra este texto. E é também o pontapé inicial para a nossa conversa.

Na mensagem que ela me encaminhou pelo Facebook, junto a imagem, ela postou também o começo da música “Bola de Meia, Bola de gude” de Mílton Nascimento e Fernando Brant, que dizia: “Há um menino, há um moleque morando sempre no meu coração. Toda vez que o adulto balança, Ele vem pra me dar a mão.” Fiquei bem impactado com a mensagem, que para mim dizia bem mais do que texto e imagem transmitiam naquele primeiro instante. E isso me fez pensar muito nos dias seguintes.

Quem é esse menino? Quem é esse moleque que vem me estender a mão toda vez que este adulto aqui balança em suas decisões, firmezas ou certezas? Alguns dias se passaram e enquanto a imagem e a mensagem fluíam no meu pensamento, o mês de junho entrou e no primeiro fim de semana veio a festa de Pentecostes.

Eu estava em retiro de silêncio. E, nos muitos desertos que aquele momento me proporcionou, eu consegui fazer uma breve síntese da mensagem que a Bianca me passou. A primeira ideia que se fortaleceu nesta reflexão foi de que aquela publicação não foi por acaso. Acreditei e acredito que foi pela Providência. 

Era fim de semana da festa de Pentecostes, como disse, e dentre tantas representações que o Espírito Santo possui, aquela imagem da Bianca para mim passou a ser uma das mais significativas. O menino, o moleque que mora em meu coração é esse fogo santo que arde aqui dentro quando o assunto é juventude e quando é pastoral. É o fogo que renasce apesar de tantas vezes que eu desanimo ao ver situações de morte ligadas ao mundo da juventude ou no ataque às opções fundamentais da PJ. Ele reacende todas as vezes que eu acho que a brasa apagou e que não vale a pena insistir.

Esse menino mora aqui dentro. Sua chama não deixa de acender. E quando a estrada está escura, ele é essa luz que alumia minha jornada e que sussurra tal como uma brisa que meu dever e minha alegria está em estender a mão. E continuar.

Desde meados de 2017, quando essa reflexão ocorreu, eu vinha pensando em publicar algumas linhas sobre estes pensamentos, mas a ideia foi se esvaziando e se cobrindo com tantas obrigações que a vida vai nos jogando. Porém, na última semana, um fato novo ocorreu da forma mais singela e misteriosa possível. Meu caçula, no meio da preparação do almoço, sai da sala, entra na cozinha e diz: “O medo é a fraqueza da verdade”. Em seguida ele volta para sala, cheio de orgulho da frase que tinha proferido. Eu tinha ali a personificação da imagem que a Bianca havia me enviado três anos antes.

O medo nos paralisa e nos impede de seguir adiante. Se ele nos impedir de fazer aquilo que nosso coração anseia e arde por realizar, nós estaremos vivendo uma mentira. Deixar que o medo paralise nossa ação é condenar nossa vida ao fracasso. 

Olhemos o exemplo dos apóstolos, lá no comecinho do livro dos Atos dos Apóstolos. Eles estavam todos trancados no Cenáculo, juntos com Maria mãe de Jesus, com medo dos judeus. Por mais que tivessem visto o Senhor ressuscitado, comido com Ele ou visto sua ascensão, era um povo ainda com medo. Esse medo os balançava. Iriam lá fora falar a verdade dos fatos, daquilo que viram, das profecias que se cumpriram ou não? Nessa hora, o menino que habitava o coração deles apareceu como em línguas de fogo e lhes estendeu a mão. E eles saíram e disseram a verdade que ardia dentro do peito, em todas as línguas e de todas as formas compreensíveis para quem os ouvissem.

Em nossa vida pastoral também carregamos esse moleque. Há tantas situações de morte na vida da juventude que precisamos da profecia da denúncia. Há tantas vidas carentes de atenção, carinho, força e cuidado que também precisamos da profecia do anúncio. Nossa espiritualidade se dá nas ações e no testemunho do cotidiano. O medo faz parte da vida e não há como negá-lo, O fogo que mora no nosso coração, na forma desse menino-moleque, no entanto, faz com que essa verdade possa se espalhar.

E me fala de coisas bonitas
Que eu acredito
Que não deixarão de existir
Amizade, palavra, respeito
Caráter, bondade, alegria e amor
Pois não posso
Não devo
Não quero
Viver como toda essa gente
Insiste em viver
E não posso aceitar sossegado
Qualquer sacanagem ser coisa normal

Um comentário:

  1. Marlene Campachi Arboleya12 de outubro de 2020 às 16:10

    Texto que me levou na busca de mais Espírito Santo!Sim de mais pois vivi suas situações está semana que me desabei na falta da força e agora o que responder? O que fazer?
    Muito obrigada por tanta sabedoria!

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