terça-feira, 7 de fevereiro de 2017

Ampliada da PJ em Crato. Minha visão

Quem leu o texto anterior (clique aqui se quiser ver do que se trata) teve uma rápida passada de olhos sobre alguns aspectos que eu considerei relevantes para entender onde a Ampliada de Crato estava fundamentada. Foi baseado em nesta visão histórica e na perspectiva de que a Ampliada trabalhasse algumas linhas prioritárias para a ação que a proposta metodológica foi desenvolvida. Pensou-se em organizar o tempo da semana que estaríamos reunidos de acordo com os cinco olhares do nosso método pastoral, não como "caixas separadas", mas com uma interação entre cada parte: Ver a realidade, Julgar a partir dos critérios da nossa fé, Agir de acordo com os elementos já fornecidos, Rever o caminho feito e Celebrar a cada dia os passos firmes que foram dados.


Sabíamos e queríamos que, ao utilizar este método, todo momento deveria ser provocativo, poderia nos incomodar e dizer que algo estava fora do lugar. E nesta Ampliada isto começou logo cedo. Dirigimos o olhar para nossa realidade, para nossas Galileias, para nossa organização. Quando se tem sentimentos de indignação e de empatia, colocar-se nestes lugares revela a necessidade de que algo precisa ser feito.

Mas não pode ser feito de qualquer maneira, existem critérios. A fé católica é centrada na pessoa de Jesus e na sua missão. Isto foi rezado, meditado, refletido através da Leitura Orante da Bíblia e durante a subida e caminhada ao Horto do Padre Cícero. Uniram-se aí dois elementos tradicionais que vem sendo resgatados pela PJ há alguns anos: a Lectio Divina e o valor das devoções populares.

E foi olhando para esta proposta que o momento do Julgar procurou tratar os temas. Partiu-se da proposta libertadora de Jesus, olhou-se para a proposta da Igreja e da Pastoral da Juventude. Ainda nesta perspectiva foi refletida a eclesiologia apresentada pelo Papa Francisco: uma Igreja em saída. “Saída para onde?”, questiona a Ampliada. “Ide para a Galiléia. Lá eles me verão”, é a resposta mais clara e objetiva. Tem-se um olhar histórico e pedagógico da caminhada até então e uma reflexão a partir do ponto de vista feminino, como resgate do histórico apresentado no texto anterior.

Sabendo qual chão que estamos pisando e para qual horizonte precisamos ir, é preciso avaliar como estamos e se estamos preparados para isso. Foi realizada previamente uma consulta junto aos regionais, dioceses e grupos. O resultado destes instrumentais daria um texto a parte. Um primeiro olhar bem superficial a respeito das respostas que foram enviadas apontaria que somos muito severos em nossas avaliações. Mas este não é o caso exatamente. Do Nacional aos Grupos de Jovens, nenhuma instância está livre de problemas, seja de ordem pessoal, econômica, de relacionamento pastoral ou mesmo estratégico.

A organização por instâncias (tal qual toda a Igreja no Brasil) é vista por muitos como um peso. A questão da representatividade que pouco contribui também é outro peso. O excesso de responsabilidades e o acúmulo de funções e tarefas se tornam mais desgastantes conforme o nível de representação também aumenta. É preciso ter mais clareza quando alguém é escolhido para um serviço pastoral. É responsabilidade de quem indica que a pessoa seja realmente capacitada para o serviço e é responsabilidade de toda equipe que acolhe que ninguém esteja sobrecarregado.

Dado esse panorama fez-se necessário dar foco na missão. Organizados nos quatro eixos pastorais (Articulação, Ação, Formação, Espiritualidade), delegados e delegadas foram discutir como responder às demandas das Galileias juvenis dentro de cada eixo. Por fim, todas as respostas que foram sistematizadas acabaram sendo escritas em grandes pétalas de papel em apresentadas num formato de flor.

Durante a noite, fez-se a escolha/votação mais simbólica e mística que eu já pude presenciar. As flores estavam postas num gramado, os presentes ao redor delas rezando, cantando e dançando uma ciranda. Todas e todos puderam ler as propostas sistematizadas e com adesivos coloridos indicar quais delas seriam escolhidas como ações prioritárias para os próximos três anos e também qual, dentre elas seria uma prioridade transversal, ou seja, que passaria por todos os eixos.

Foram indicadas as seguintes prioridades:

ESPIRITUALIDADE
Reafirmar a espiritualidade libertadora (ofício, Leitura Orante da Bíblia, escolas populares de liturgia, Bíblia, etc.) visando despertar a espiritualidade do cuidado.

AÇÃO
Promover uma campanha para enfrentamento dos ciclos de violência (simbólica, psicológica, financeira, doméstica, sexual e midiática) contra as mulheres.

FORMAÇÃO
Repensar a forma como trabalhamos a formação integral, considerando a importância e necessidade de aproximar, conhecer as diversas Galileias Juvenis, dinamizando as ações, adotando os direitos humanos como um tema transversal/gerador que perpasse as dimensões.

ARTICULAÇÃO
Aproximar e estabelecer parcerias com as pastorais e organismos sociais que possibilite uma ação transformadora nas várias realidades juvenis e ao mesmo tempo garantir viabilidade e fortalecimento de nossa organização e formação ampla.

TRANSVERSAL
Formação bíblico-teológica para redescobrir o ser humano a partir da sua integridade, com um olhar especial para o feminino.

Desenvolver cada uma delas é um trabalho riquíssimo. Há dezenas de possibilidades para cada uma e outras tantas para trabalhos inter-relacionados. Foi esse o trabalho do dia seguinte: detalhar cada uma dessas prioridades para que pudessem ser mais bem trabalhadas pelas instâncias pastorais.

Fazia-se necessário ainda discutir como a PJ Nacional se organizaria para dar conta destas demandas. A estrutura atual daria conta? Seria preciso repensar os serviços, tarefas, representatividade, acompanhamento para que a missão pudesse dar resultados.

Um ponto importante decidido é que a PJ não se organizaria mais pelos projetos nacionais, que deixaram de ter este nome e foram transformados em linhas de ação. Por quê? Porque é assim que boa parte das dioceses e grupos vem trabalhando. Porque desta forma desburocratiza as instâncias. E também porque assim se amplia mais o horizonte de ação e se contempla mais efetivamente as prioridades elencadas.

Dentro do aspecto organizacional, a secretaria nacional era uma grande preocupação. Chegamos à Ampliada com um cenário posto: dos indicados para este serviço, todos declinaram do convite, ou seja, não havia quem escolher naquele momento. Duas medidas foram tomadas: o serviço seria remodelado, priorizando o aspecto missionário e redistribuindo o serviço burocrático e documental entre os membros da coordenação nacional, e o processo de escolha seria reaberto. Foi a melhor decisão ao meu ver. E é nisto que a coordenação nacional da PJ está trabalhando.

Quando foi analisado o serviço da assessoria nacional, houve a primeira e única grande divergência. Diante dos quatro cenários possíveis e propostos previamente pelos grupos de trabalho não houve consenso ou escolha por uma ideia que gerasse coesão. Neste sentido todas elas foram levadas pela equipe de sistematização para discussão em plenária. Uma quinta possibilidade foi criada na hora.

O processo então se tornou um tanto confuso. Abertas defesas, contestações e esclarecimentos, partiu-se para a votação. Foi aprovada por um voto de diferença que a nova CNA deveria ter cinco assessores, um por região geográfica. A proposta que estava nesta disputa era manter o formato atual de seis assessores sem a obrigatoriedade de região. Nenhuma outra teve votos. Não houve abstenções.

Dois dos cinco indicados presentes compreenderam que houve uma alteração no processo prévio de indicações e retiraram seus nomes. Os delegados ficaram divididos novamente. Havia quem apoiasse essa decisão, quem a contestasse e quem não estava entendendo nada. Isto culminou num mal estar geral. Por ser a última deliberação antes das eleições, ficou a impressão de fracasso e alguns diziam ser este o fim da PJ. Mas crer nisso é um erro, erro enorme. Não foi um fracasso. Foi uma crise na organização, não na missão. Dizer isto não é colocar panos quentes. O mal estar foi real e não havia como encaminhar o restante das discussões. A plenária foi suspensa até o dia seguinte.

A Comissão Nacional de Assessores se reuniu a parte e depois com todos os indicados para o serviço a fim de pensar numa melhor proposta de encaminhamento. Fez-se posteriormente a conversa com a Coordenação Nacional da PJ e chegou-se a deliberação a ser proposta à plenária de que o processo de indicação para a assessoria nacional também seria reaberto, juntamente com a Secretaria Nacional, para novas indicações de nomes dentro da proposta aprovada. Com exceção dos indicados que retiraram seus nomes, os demais se mantiveram neste novo processo.

Não houve votações no domingo, último dia; utilizamos a manhã para que as conversas de corredor pudessem ser expostas e as pessoas pudessem expressar seus sentimentos. Partimos em seguida para a missa de envio. Foi um momento necessário e marcante também, ao menos para mim. Muita emoção e ressignificação dos processos vividos. Muitas lágrimas e abraços sinceros. Homenagens a toda turma que trabalhou, mas destaco aqui uma atenção especial à turma do Ceará, gente bonita e dedicada que garantiu todo o suporte para que a atividade pudesse correr adequadamente.

Hoje, olhando o que vivemos e após muitas e muitas conversas, tenho um olhar de esperança. A ideia de fracasso não se sustentou. As pessoas voltaram para suas realidades com o impulso de que muita coisa tem que ocorrer ali, no chão concreto onde pisam. Por quê? Porque quando se olha para as prioridades definidas, percebe-se que são possibilidades reais, processualmente bem discutidas, surgidas de anseios postos e perfeitamente aplicáveis.

Aí você volta sua atenção para a história da PJ, para estes mais de 40 anos, e percebe que divergências fazem parte do processo e que discordâncias muito maiores já aconteceram. Percebe também que após cada crise a PJ sai mais fortalecida e com soluções criativas. E ainda mais. Olhando pra história de uma forma geral a gente sabe que quem se dividiu perdeu espaço e foi minguando. Jesus já disse isso. Portanto, é fato que o momento pede união em torno das propostas aprovadas.

É preciso que se diga que muita coisa precisa ser redescoberta, outras revigoradas e outras ainda ganharem um novo formato (Feliz de quem entende que é preciso mudar muito pra ser sempre o mesmo. - Dom Hélder Câmara). Creio que, olhando para as prioridades, há várias possibilidades para que sejam colocadas em prática. Mas falar disso é pra outro momento.

Olhem para suas realidades. Já tem muita coisa acontecendo e creio que a partir de agora teremos muito mais. Relatem. Divulguem. Daí, basta caminharmos unidos, tendo em vista o horizonte lá na frente e semeando as flores ao longo dessa jornada. Há muitas chances de deixarmos este legado florido para quem vem depois de nós. E então eles e elas poderão realizar um belo trajeto.

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