sexta-feira, 21 de abril de 2017

Sobre riscos, fundamentalismos e resgate histórico

Conhecer alguém é sempre um risco (ou vários). Risco de gostar dessa pessoa, risco de querer saber mais de sua vida, seus gostos e sua história. Claro que há quem já tenha vivenciado o tal do amor à primeira vista, mas isso, nem sempre isso é imediato. Na via das paixões, a grande tendência é que, convivendo, a gente perceba aqui e ali algumas características que vão criando os tais encantamentos.

Sim, isso acontece de pessoas com pessoas. Mas também acontece de pessoas com ideias e de pessoas com propostas. Claro. Da imensa multidão de pessoas que você conhece, não é por todas que você se apaixona. Da mesma forma, há uma quantidade imensa de proposições, ideologias, linhas de pensamentos, religiões, filosofias, modos de vida que você também não abraça.


Quero crer, no entanto, que, da mesma maneira que há aquela pessoa que mexeu, mexe ou um dia mexerá com seu coração de uma maneira diferente, também há no mundo das ideias e propostas aquelas as quais você dará maior atenção e que guiarão seu modo de vida ou moldarão sua maneira de ser.

Amor e paixão são assuntos empolgantes, mas delicados. A gente corre o risco (olha aqui ele de novo) de perder a racionalidade. Falar mal do time do coração, da religião que se professa, da pessoa amada, do partido ao qual se é filiado, do modus operandi dessa ou daquela instituição que se admira, é um campo fértil para a discussão e a intolerância. Diariamente eu vejo isso nas redes sociais.

Mas não há escapatória. O método dialético, descrito de forma simples, aponta que nenhuma síntese, nenhum novo modelo, pode aparecer se não for confrontada a tese (ou a situação atual), com sua antítese. Pelo modo racional e rasteiro de dizer, deixar de discutir com alguém (antítese) porque ela não vai mudar de opinião (tese) é acreditar que não vale a pena achar alternativas (síntese).

Num mundo onde o fanatismo tem crescido, de fato, esta tarefa dialética tem se mostrado cada vez mais difícil. Pessoalmente acho o confronto pouco produtivo. As pessoas estão armadas, cercadas, bloqueadas contra o confronto. Os tais muros estão cada vez mais sólidos e fortificados. Bater de frente não é uma boa alternativa.

Se confrontar não é uma boa, talvez uma alternativa mais favorável fosse resgatar. Resgatar a história. Entender porque se chegou àquele momento, daquela maneira. Compreender em que ponto ou em que curva não se pôde mais voltar atrás ou achar um novo caminho. Pessoalmente creio que a contraposição histórica e fundamentada tem dado melhores resultados que a pura argumentação.

Eu tenho para mim que na PJ procuramos fazer isso e que talvez por essa razão nosso povo não seja tão fanático como alguns por aí nos pintam. Claro que às vezes a gente erra, esquece-se de olhar o passado e fica fascinado pelo futuro que se pode construir. Claro que frequentemente a gente bate de frente com pessoas carregadas de argumentos pouco sólidos, mas que construíram para si um muro resistente a este tipo de argumentação.

Desde a Ampliada de Crato eu venho pensando nisso. Na necessidade de olharmos, entendermos e refletirmos nossa história, nossas opções e de por que aqui ou ali houve uma curva, um recuo. Pensar nisso também é um risco, porque a interpretação histórica é sempre um ponto de vista a partir do lugar de quem a escreveu ou a defende. E, nos tempos em que vivemos, apresentar um ponto de vista é abrir o processo, não para o debate, mas para o enfrentamento.

Resolvi então resgatar alguns livros que tenho em casa. Quis tentar juntar o meu olhar ao de tantos outros que escreveram a história antes de nós. Quis também ampliar o meu horizonte. Já falo de história pastoral há algum tempo. Mas quis entender de onde estas outras pessoas escreviam, para quem e por que deixaram seus pontos de vista.

A PJ, tal qual a pessoa pela qual a gente se apaixona, vai nos conquistando pelo processo, pela aproximação, pelo cotidiano, pelas opções. Quem se abre para a experiência, encara o risco de encontrar um propósito pelo qual valha a pena dedicar a vida. E o melhor: ela nos faz enamoradas/dos não de si, porque ela não anuncia a si própria, mas de um jeito de viver a proposta de Jesus.

Foi buscando porque somos o que somos e temos o jeito que temos que, como coloquei acima, vasculhei alguns dos livros de casa. Um deles me deu a chave. O livro “O Caminho se faz”, do padre Hilário Dick diz logo pela metade do seu primeiro capítulo que a Pastoral da Juventude do Brasil herdou 10 características de um modelo de organização chamado Ação Católica.

Ação Católica. A gente sempre fala dela quando o assunto é a História da PJ. Mas creio que vasculhar um pouco as suas motivações, história, apogeu, método e processo deve nos ajudar a entender também e a realizar um pouco do nosso próprio resgate, para que não caiamos nas armadilhas históricas e que saibamos nos resguardar dos fundamentalismos. Compreender melhor tudo isso é assumir o risco de reinterpretar ou reassumir o que somos, mas também de nos apaixonarmos mais pela proposta.

Mas isso fica para um próximo texto.

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Porque nesse texto há uma comemoração implícita pelos 7 anos do blog.

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