quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Ética na Pastoral

Parcerias. Para alguns é a salvação da lavoura. Para outros é uma canoa furada. No último artigo, defendi que elas são importantes. Mas será que podemos ir mergulhando de cabeça em toda parceria que nos pareça vantajosa? Claro que todos cometemos erros e deveríamos aprender com eles. Mas isto nos permitiria errar? Como o grupo deve ultrapassar a linha que divide o isolamento da abertura plena? Buscar parceiros, dentro ou fora da Igreja, repito, é importante, mas...

28.    Toda parceria é válida?

Numa primeira análise, pode-se responder que não, não é válida toda e qualquer parceria. É simples entender o porquê. Todo grupo constituído possui valores que lhe são próprios e lhe são caros. Conflitos de valores podem causar estranhamentos e conflitos difíceis de se contornar.

É o caso, por exemplo, do grupo de jovens que quer fazer uma festa no bairro onde está inserida a sua comunidade e sai arrecadando fundos. Um comerciante ajuda, a vizinhança colabora, a escola cede o som e um vereador, conhecido pela corrupção e pelo lema do “rouba, mas faz”, quer contribuir na divulgação do evento. Os valores de ética na política, propostos pelo grupo de jovens e a prática de corrupção não combinam. Vale a pena firmar esta parceria?

Uma segunda análise, porém, diz que existem parcerias e parcerias... Apesar de grupos distintos terem valores diferentes, eles poderiam trabalhar juntos em áreas que não estivessem ligadas diretamente à zona de conflito.

Podemos ver este caso quando um outro grupo de jovens resolve colaborar na campanha promovida pelo posto de saúde do bairro em prol da conscientização sobre o diabetes. A rapaziada se envolve tanto na iniciativa que convidam colegas da escola e da rua. Alguns destes outros jovens participam de um grupo de outra religião. Esta diferença, entretanto, não os impedem de trabalharem juntos pelo bem comum.

Pode parecer simples pelos exemplos dados, mas nem sempre se percebe logo de cara. Existem hoje duas ideias muito difundidas entre nós, mas que nada tem de cristianismo: “o fim justifica os meios” (interpretação das leituras de Maquiavel) e “eu gosto de levar vantagem” (a famosa “Lei de Gérson”, conhecida também por “jeitinho brasileiro”).

A questão da escolha das parcerias passa por um critério ético. (só para clarear, ética vem do grego e pode ser entendida como “modo de ser, caráter, costume”; os romanos traduziram ética por moral; existem diferenças entre os termos, mas não é o caso de tratar delas agora). Dentro das relações sociais, nos momentos de dúvidas ou conflito, as questões éticas e morais acabam por surgir. E é natural que apareçam. São questões que estão ligadas às escolhas, ações e comportamentos. E cada grupo social possui o seu código de conduta e juízo de valor.

Acreditar que o fim justifica os meios é aceitar, por exemplo, o tal do “rouba, mas faz”, ou que as “experiências científicas” dos campos de concentração eram válidos porque poderiam sair dali remédios ou procedimentos para salvar outros tantos milhões de vítimas. Não faz parte da nossa ética cristã acreditar ou seguir isto.

E a tal da “Lei de Gérson” é o primor da centralidade no indivíduo em detrimento do bem social. “Que se explodam os outros. Eu quero é me dar bem”. E a tal da lei emplacou tanto que é adotada e até incentivada por organismos e corporações como forma de empreendedorismo e vale tanto para a pessoa quanto para grupos e empresas. Basta uma busca simples na internet para perceber isto. “Que se explodam os concorrentes. Nossa Organização é que deve alcançar os primeiros lugares”.

Devemos ter cuidado, portanto, com quem e como fazemos parcerias. Não é uma escolha natural e nem tão simples assim. Convivemos todos na mesma sociedade e acabamos por nos relacionarmos uns com os outros. E, por vezes, mesmo contra nossa vontade, acabamos por depender neste ou naquele aspecto dos grupos contrários aos nossos valores éticos e morais.

É o que aconteceu numa cidade X, onde o prefeito é de um partido com muitos membros acusados de corrupção e enriquecimento ilícito. Sua base governista é formada por muitos seguidores da tal da “Lei de Gérson”. Aconteceu de que a secretaria de cultura do município desenvolveu um projeto para popularizar a cultura na periferia da cidade. Um grupo de jovens da Paróquia de São Rogério resolveu entrar na iniciativa e montou um projeto de poesia e música popular nas praças do bairro. O projeto foi aprovado e eles foram financiados. Dentro da situação descrita, você acha que o grupo fez o certo? Teria alguma alternativa dentro deste cenário?

Um comentário:

  1. Olá,

    Gostei da sua reflexão sobre: Toda parceria é válida?

    Resumidamente quero dizer que comungo das palavras de Marilena Chauí "Para que os fins sejam éticos é necessário que os meios sejam igualmente éticos" ou seja, os fins não justificam os meios.

    Um Abraço!!!

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